Tabu

O que acontece quando alguém vai em um Mostra de Cinema Japonês assistir filmes com estilos que não está acostumado e vai fazer uma resenha?
O resultado pode ter certeza: é desastroso.
Então para não cair no erro de falar do que não sei, abaixo vai duas críticas "profisssionais"de um bom filme: TABU, de Nagisa Oshima.
(além de um trailer e uma das cenas iniciais do filme - que mostra uma otima sequencia de duelo)

Com problemas de saúde, o consagrado cineasta japonês Nagisa Oshima - autor de preciosidades como O Império dos Sentidos, Furyo – Em Nome da Honra e A Balada de Narayama – não filmava desde 1991. Recuperado, seu nome e seu prestígio conseguiram levantar financiamentos na França, na Inglaterra e no Japão para a realização deste sensível Tabu, filme que estréia neste final de semana no Brasil.

Tabu foi rodado em 1999 e a ação é ambientada em 1865. Naquele momento, na cidade de Kyoto, jovens determinados e disciplinados se candidatam ao invejado posto de lutadores nas milícias samurai. A seleção é das mais rigorosas. Entre os vários candidatos, poucos conseguem a vaga. Entre eles estão Kano (Ryhuei Matsuda) e Tashiro (Tadanobu Asano). Kano tem maneiras finas, vem de família rica e os traços de seu rosto são quase andróginos. Tashiro, por outro lado, é rude e de linhagem rústica. Logo Tashiro se apaixona por Kano e não mede esforços para conseguir o objeto do seu desejo.

Em pouco tempo, a presença sensual de Kano quebra toda a paz que reinava no lugar. De uma forma ou de outra, comandantes, oficiais e samurais se sentem perturbados, incomodados ou atraídos pelo jovem samurai. Sentimentos contidos vêm à tona, a desconfiança impera e até crimes são cometidos em nome da homossexualidade de Kano.

Para quem já havia realizado o altamente erótico O Império dos Sentidos, em 1976, Tabu não chega a ser polêmico. Foi-se o tempo em que a homossexualidade nas telas de cinema causava alguma estranheza entre o público. Tampouco a polêmica parece ser a intenção de Oshima neste seu novo trabalho. Fiel às tradições do cinema japonês, o diretor realiza um filme contemplativo e introspectivo, em que as emoções permanecem entaladas nas gargantas. Mais que explorar o homossexualismo do personagem principal, o diretor prefere enfocar as diversas reações causadas pelo “diferente” por tudo aquilo que é considerado “fora dos padrões”. Teoricamente, o centro de treinamento dos samurais seria um modelo de quietude e disciplina. Até o momento em que a simples presença de alguém que ousa ser diferente dos demais desencadeia uma série de sensações até então inconfessáveis, que acabam desembocando em tragédia. Como diz um dos letreiros do filme, “No céu, não há segredos. E na Terra, tudo se sabe”.

A sensualidade pura e simples é suficiente para desmoronar todo um modelo baseado em falsas aparências. Um jovem bonito, sozinho, consegue questionar e derrubar toda a suposta rigidez dos códigos dos guerreiros. Os padrões milenares são colocados em xeque.

Todo este questionamento e este represamento sexual são embalados pela música simples e eficiente de Ryuichi Sakamoto, o autor de trilhas como O Último Imperador e De Salto Alto e Furyo – Em Nome da Honra.

Tabu não é um filme de puro entretenimento. Tampouco se encaixa na categoria de “indecifrável”. Trata-se de um saudável meio termo entre o estilo filosófico oriental e o ritmo exigido pelo público ocidental. Um belo trabalho que merece ser conferido por quem está aberto a um estilo mais artístico que comercial de se fazer cinema.

Completa o elenco o ator e diretor Takeshi Kitano, aqui assinando com seu pseudônimo ocidental Beat Takeshi.

Celso Sabadin**
11 de julho de 2001

** Celso Sabadin é jornalista e crítico de cinema da Rede Bandeirantes de Televisão, Canal 21, Band News e Rádio CBN. Às sextas-feiras, é colunista do Cineclick. celsosabadin@cineclick.com.br






Tabu mostra o vigor de Nagisa Oshima

por KLEBER MENDONÇA FILHO

Tabu (Gohatto/Tabou, Japão, 2000) é uma história de amor e desejo entre samurais, do controvertido diretor de O Império dos Sentidos (Ai No Corida, 1976), Nagisa Oshima. O filme, elegante e sexualmente contido, examina com humor seco e rigor estético o efeito que um samurai chamado Sozaburo Kano (Ryuhei Matsuda) tem sobre o clã Shinsengumi, no templo Nishi-Honganji, em Kyoto, nos idos de 1865.

O clã é formado por homens seguidores de rígido código de honra que inclui o item “não lutar por questões pessoais”. Sozaburo, 18 anos, rosto andrógino (traços de uma gueixa mas a rispidez nos movimentos de um homem), fartas mexas femininas, perturba o emocional do também recruta Hyozo Tashiro (Tadanobu Asano) em maneiras que extrapolam a simples camaradagem de caserna. Vivem um caso de amor, onde Sozaburo aparenta desempenhar o papel feminino, passivo.

Passivo apenas à noite, já que Sozaburo é exímio espadachim, ágil como poucos e altamente disciplinado. Sua estréia no clã envolve a decapitação sumária de um condenado, tarefa que executa com determinação impressionante, e que Oshima filma com realismo chocante.

As seqüências de luta com espadas ou tacos de madeira representam alguns dos melhores momentos do filme, sonorizadas como sucessivos choques entre locomotivas a 200Km/h. São reminescentes dos duelos de sabres de luz, em Guerra nas Estrelas, já uma apropriação dos antigos filmes de samurai.

De qualquer forma, combates à parte, Tabu é um filme de Samurai diferente e original, sobre homens em profunda concentração, sentindo as ondas de uma sexualidade ilícita reverberando com grande força num código de conduta que não prevê esse tipo de sentimento.

Há uma forte geração de conflito e tensão, especialmente por existir no ar, por parte de todos, não tanto uma negação violenta da sexualidade, mas um fascínio discretamente conformado pelos caminhos da carne, uma ambigüidade consciente que se torna um dos pontos mais interessantes do filme. Na verdade, essa ambigüidade, verdadeiro ouro narrativo, tem aparecido com freqüência no cinema asiático recente, especialmente em Amor à Flor da Pele (Hong Kong) e As Luzes de Um Verão (Vietnã).

Sinal forte disso é a forma como a sexualidade dúbia do recruta Sozaburo parece intrigar e atrair, cada um à sua maneira, os mestres e samurais, mesmo os heterossexuais, que observam o clã entrar em ebulição numa série de atos violentos frutos de elementos perigosos e que não parecem se misturar: são samurais sob o efeito confuso do desejo e Sozaburo parece ter ‘a força’ junto dele. Como aquele garoto de Morte em Veneza, de Visconti, a qualidade andrógina de Sozaburo intriga o espectador e o faz roubar cenas, mesmo aolado de um rosto como o do cineasta Takeshi Kitano (aqui como ator, assinando Beat Takeshi).

À certa altura, Kitano, como um mestre do clã, observa o combate anormalmente brutal entre o casal de amantes e chega a uma conclusão correta e intrigante: “estes dois se amam!”. Oshima faz uma análise impecavelmente realizada sobre beleza e brutalidade, temas traduzidos na imagem impactante que encerra o filme.

É irônico ver este diretor veterano (68 anos) num filme tão vigoroso. Oshima não filmava há 15 anos foi ao Festival de Cannes 2000 numa cadeira de rodas, já que sofrera derrame, dois anos antes. “Fazer esse filme foi uma terapia importante para mim. Qualquer tema que ajude a quebrar barreiras deve ser tratado com esforço pessoal”, disse na época.





Comentários

  1. Eu gosto de cinema japonês, quer dizer, assisti pouco, mas o pouco que assisti gostei!
    Vou ver se encontro esse para ver pois fiquei curiosa.
    Bjos e boa semana!
    Ly

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